Hermínio Bello de Carvalho chega aos 90 anos em silêncio, mas quem disse que eu te esqueço, compositor e poeta?
28/03/2025
(Foto: Reprodução) Hermínio Bello de Carvalho faz 90 anos nesta sexta-feira, 28 de março
Philippe Leon / Divulgação Selo Sesc
♫ ANÁLISE
♪ Nascido em 28 de março de 1935, o compositor, poeta, escritor, produtor e diretor carioca Hermínio Bello de Carvalho cruza hoje a fronteira dos 90 anos. Há um certo silêncio no universo musical que não se afina com a importância do artista e com o simbolismo da efeméride, só que, reproduzindo verso do samba composto por Hermínio com Dona Ivone Lara (1918 –2022) e lançado em 1981 na voz de Nana Caymmi, mas quem disse que eu te esqueço?
Somente pelo fato de ter descoberto Clementina de Jesus (1901 – 1987) – ou ter “prestado atenção” em 1963 na então desconhecida cantora fluminense, como Hermínio prefere dizer – o poeta já merece ser lembrado eternamente. Sem falar que a obra autoral como compositor letrista já é outro salvo-conduto para o poeta entrar na eternidade.
Com Cartola (1908 – 1980) e Carlos Cachaça (1902 – 1999), Hermínio fez nascer Alvorada (1968), samba de grande beleza melódica e poética. Com Sueli Costa (1943 – 2023), o poeta soltou Cobras e lagartos em 1975 na voz de dramática de Maria Bethânia.
Com Chico Buarque, Hermínio pavimentou Chão de esmeraldas (1997) para celebrar a Mangueira, escola de samba na qual o coração do poeta já vislumbrara a poesia que lateja em cada verso de Sei lá, Mangueira (1968), samba assinado com o portelense Paulinho da Viola, também parceiro em Timoneiro (1996), último grande sucesso do cancioneiro de Hermínio.
Entre a súplica acariciante do choro Fala baixinho (1964, com letra posterior de Hermínio Bello de Carvalho, 1967), o confeito delicado de Doce de coco (Jacob do Bandolim, 1951, com letra posterior de Hermínio Bello de Carvalho, 1968) e a trilha ruralista de Estrada do sertão (João Pernambuco com letra posterior de Hermínio Bello de Carvalho, 1985), o poeta firmou parceria póstuma com Jacob do Bandolim (1918 – 1969) ao letrar o choro Noites cariocas (1957) com versos apresentados ao Brasil em 1979 na voz de Gal Costa (1945 – 2022).
Em 1975, abriu parceria com Vital Lima. Em 2008, se tornou parceiro de Lucas Porto, violonista que tem propagado o legado de Hermínio. Entre uma parceria e outra, como esquecer Pressentimento (1968), obra-prima da parceria do poeta com Elton Medeiros (1930 – 2019)?
Se o nome do compositor letrista já tem lugar de honra na história da música brasileira, o produtor, diretor (de shows) e agitador cultural também não faz por menos. Hermínio Bello de Carvalho produziu o álbum Gente da antiga – disco de 1968 que reuniu Clementina de Jesus, Pixinguinha (1897 – 1973) e João da Baiana 1887 – 1974) – e esteve envolvido na criação de discos emblemáticos da cantora Elizeth Cardoso (1920 – 1990), como Elizete sobe o morro (1965).
Sem falar nos 24 livros, nos incontáveis shows que roteirizou, dirigiu e/ou produziu e nos discos que Hermínio idealizou em tributo a ele mesmo quando festejava aniversários em datas redondas. O primeiro disco no gênero, Lira do povo, saiu em 1985 para celebrar os então 50 anos do poeta.
Agraciado em 2000 com a Ordem do Mérito Cultural, honraria concedida pelo Ministério da Cultura, Hermínio Bello de Carvalho é artista arraigado às tradições da música brasileira. Foi com essa ideologia tradicionalista que o poeta construiu obra que torna injusto qualquer esquecimento da importância do já nonagenário compositor e produtor na música do Brasil. Mas quem disse que eu te esqueço, Hermínio Bello de Carvalho?...